Mineração ilegal de ouro na fronteira amazônica cresce e se torna lucrativa para redes criminosas

Além do impacto econômico e de segurança, a prática preocupa autoridades ambientais, já que provoca degradação dos rios e acelera o desmatamento

Um relatório da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) aponta que a mineração ilegal de ouro tem avançado na região de fronteira entre a Amazônia brasileira e a Colômbia, consolidando-se como a principal atividade criminosa e o ilícito ambiental mais lucrativo da área.

O estudo indica que o crescimento do garimpo ilegal é impulsionado por fatores como os altos preços do ouro no mercado internacional, a limitada presença do Estado em extensas áreas da região e a elevada porosidade das fronteiras, que facilita a atuação de redes criminosas transnacionais.

Além do impacto econômico e de segurança, a prática preocupa autoridades ambientais, já que provoca degradação dos rios e acelera o desmatamento. A proteção das florestas é um tema central da COP30, que ocorrerá em Belém neste mês.

A pesquisa foi conduzida em parceria com a DNI (Direção Nacional de Inteligência) da Colômbia e destaca que o narcotráfico, a mineração ilegal de ouro e o tráfico humano representam as principais ameaças à segurança humana e ambiental na região. Trata-se do primeiro documento público conjunto entre serviços de inteligência sul-americanos sobre essas questões.

No Brasil, estima-se que a mineração ilegal responda por aproximadamente um terço de toda a produção anual de ouro. Na faixa de fronteira amazônica, a situação é ainda mais crítica, com quase toda a extração realizada de forma ilícita. Segundo a Abin, o comércio ilegal do metal na América Latina e Caribe atingiu níveis de rentabilidade recorde nos últimos anos, com o preço do ouro subindo mais de 40% em 2024, chegando a US$ 3.000 (R$ 16,1 mil) por onça (31,1 gramas) em março de 2025.

No Brasil, o garimpo é realizado principalmente em rios, utilizando balsas e dragas de diferentes portes. Rios como Caquetá-Japurá, Putumayo-Içá, Amazonas-Solimões e seus afluentes formam uma extensa rede fluvial que sustenta tanto a extração de ouro quanto o tráfico de drogas. Segundo informações da Folha, facções como CV (Comando Vermelho) e PCC (Primeiro Comando da Capital) mantêm negócios com grupos colombianos, tanto para trazer drogas ao Brasil quanto para escoar produtos para Europa e África.

A modalidade predominante é a mineração de aluvião, que extrai minerais de depósitos sedimentares nas margens e leitos dos rios. O uso de mercúrio e combustíveis fósseis é comum para separar o ouro dos sedimentos e movimentar bombas e equipamentos. Balsas menores medem entre 10 e 30 metros e custam a partir de US$ 15 mil (R$ 80,7 mil), enquanto dragas de alta potência podem ultrapassar 100 metros de extensão e demandar investimentos milionários.

A operação dessas embarcações altera a turbidez e a composição química da água, afetando micro-organismos, plantas, peixes e predadores maiores, além de impactar comunidades indígenas e ribeirinhas que dependem dos rios para alimentação e cultura. A atividade também impulsiona o desmatamento; na região do rio Puruê, entre janeiro de 2019 e agosto do ano passado, a mineração ilegal destruiu 2.559,86 hectares de floresta.

Municípios próximos às áreas de garimpo, como Japurá, Jutaí, Santo Antônio do Içá e Tabatinga, no Amazonas, se consolidaram como centros logísticos de apoio à mineração ilegal, que muitas vezes constitui a principal atividade econômica da população local, diante da escassez de alternativas sustentáveis.

O relatório da Abin classifica as operações ilegais em quatro categorias: redes criminosas, grupos armados ou organizações transnacionais, mão de obra e facilitadores. No Brasil, parte do ouro extraído é vendido diretamente nas áreas de garimpo e em cidades vizinhas sem registro formal, enquanto outra parcela segue para centros de “esquentamento”, como Manaus e Itaituba (PA), entrando na cadeia legal por meio de notas fiscais irregulares ou fraudulentas.

Na Colômbia, a mineração ilegal está intimamente ligada ao narcotráfico. Grupos armados investem em minas, extorquem garimpeiros e convertem o ouro em imóveis, negócios ou depósitos bancários, ou ainda o utilizam para financiar o tráfico de cocaína e maconha. Estima-se que, atualmente, os lucros da mineração ilegal superem os do próprio narcotráfico. Jovens indígenas são frequentemente recrutados para trabalhar na exploração do ouro, no tráfico e na produção de cocaína, recebendo até pagamento em pasta base. Esse contexto contribui para aumento do consumo de drogas, violência e suicídio nas comunidades afetadas.

No Brasil, não há evidências de que facções criminosas atuem diretamente na extração ilegal de ouro, embora se beneficiem do comércio e do escoamento do metal.