O dólar encerrou a sessão desta sexta-feira (5) em forte valorização, subindo 2,33% e alcançando R$ 5,434, após a confirmação de que Jair Bolsonaro escolheu o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) como seu candidato para a eleição presidencial de 2026. A confirmação foi feita pelo próprio senador horas antes do fechamento do mercado.
De acordo com Daniel Teles, sócio da Valor Investimentos, a reação imediata dos investidores tem relação direta com a leitura de que a decisão reduz o espaço político para uma eventual candidatura de Tarcísio de Freitas (Republicanos), considerado o nome preferido do mercado financeiro para enfrentar o presidente Lula (PT) na corrida eleitoral. O especialista explicou que, para os agentes econômicos, Tarcísio seria o candidato mais competitivo no campo da direita, e que a entrada de Flávio sem apoio total do ex-presidente fragmentaria esse eleitorado, elevando, assim, a percepção de que aumentam as chances de reeleição de Lula.
No auge da oscilação, por volta das 16h, a moeda norte-americana chegou a R$ 5,485, avanço de 3,30%. O patamar é o mais elevado desde 16 de outubro. Ao longo da semana, o ganho acumulado foi de 1,86%. Em sentido oposto, a Bolsa brasileira teve um pregão de queda acentuada: recuou 4,30% e fechou a 157.369 pontos, apagando as máximas recentes. Durante o dia, o Ibovespa oscilou intensamente: abriu em 164.460 pontos, mas a partir das 13h iniciou uma trajetória firme de baixa, chegando ao piso de 157.006 pontos, por volta das 17h30.
A virada coincidiu com a publicação de uma reportagem do portal Metrópoles, posteriormente confirmada pela Folha, noticiando a intenção de Bolsonaro de oficializar Flávio como seu representante na disputa presidencial. O senador anunciou mais tarde, em suas redes sociais, que recebeu essa missão do pai, descrevendo a decisão como um ato de grande responsabilidade e ressaltando que enxergava o apoio paterno como um chamado para dar continuidade ao projeto político do grupo.
Para Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad, a disparada do câmbio também foi influenciada pelo movimento recente de alta do real e da Bolsa, criando um ambiente mais vulnerável a correções bruscas. A especialista avaliou que, diante do acúmulo de ganhos, investidores tendem a vender posições com maior facilidade quando surge incerteza política, gerando fluxos de saída antes mesmo que os efeitos do noticiário sejam completamente absorvidos.
Outro fator que tradicionalmente impacta o câmbio em dezembro é o envio de recursos ao exterior em razão da distribuição de dividendos, o que costuma aumentar a demanda por dólar. Teles lembrou que empresas repassam dividendos a acionistas que, por sua vez, remetem parte dos valores para fora do país, um movimento mais forte neste período.
João Daronco, da Suno Research, afirmou que o chamado “efeito Flávio” dominou o pregão, mas avalia que, nas próximas semanas, a discussão sobre tributação pode ter peso semelhante na Bolsa. Por outro lado, o fluxo de capital estrangeiro continua robusto: em novembro, investidores internacionais responderam por 58,9% do volume total negociado, acumulando R$ 546 bilhões em aplicações.
Rodrigo Marcatti, CEO da Veedha Investimentos, observou que há um movimento global de realocação de capital motivado pelos cortes de juros nos Estados Unidos, direcionando recursos para bolsas emergentes. Para ele, esse cenário tende a sustentar novas altas no Ibovespa assim que a volatilidade diminua, uma vez que qualquer entrada adicional de capital provoca rápida elevação do índice.
Antes da turbulência política, os investidores estavam concentrados na divulgação do PCE, indicador considerado pelo Federal Reserve como a principal referência para avaliar a trajetória da inflação americana. O relatório apontou uma leve alta de 0,3% nos gastos dos consumidores em setembro, sinalizando perda de força da economia no fim do terceiro trimestre. Segundo analistas, o conjunto dos dados — incluindo desaceleração no mercado de trabalho e aumento do custo de vida — reforça a possibilidade de um novo corte de juros na reunião do Fed marcada para o dia 10.
Zogbi classificou o relatório como benigno e indicou que ele mantém aberta a possibilidade de redução das taxas. No entanto, lembrou que o documento está defasado, já que o “shutdown” do governo americano interrompeu a coleta de dados a partir de agosto. Por isso, a influência do relatório na decisão final pode ser limitada.
Dados recentes do mercado de trabalho americano também trouxeram leituras divergentes. Os pedidos iniciais de seguro-desemprego recuaram para 191 mil na última semana de novembro, atingindo o menor nível desde setembro de 2022. Entretanto, um relatório da ADP mostrou o fechamento de 32 mil vagas no setor privado em novembro, contrariando a expectativa de geração de 10 mil empregos. Para João Soares, sócio da Rio Negro Investimentos, o resultado representa uma retração mais forte que a esperada, sugerindo desgaste adicional da economia americana.
Com sinais mistos, a decisão do Fed tende a ser dividida. O payroll — relatório-chave sobre o mercado de trabalho — continua atrasado e só será atualizado em 16 de dezembro, após a reunião do banco central. Já no Brasil, a expectativa é quase unânime: o BC deve manter a Selic em 15%, conforme indicado pela própria instituição ao defender a necessidade de manter juros contracionistas por um período prolongado.