Durante uma entrevista concedida nesta quarta-feira (14), o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou que, caso venha a ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no processo relacionado à tentativa de golpe em 2022, sua carreira política estará definitivamente encerrada. Segundo ele, não haveria mais instâncias para recorrer, o que tornaria a situação, em suas palavras, um “game over”.
Conhecido por sua longa trajetória de embates com o Judiciário, Bolsonaro disse não se sentir satisfeito com o desgaste enfrentado pelo STF. “Não fico feliz em ver o Supremo sendo criticado. Quando se analisa a popularidade da instituição, está abaixo até do Legislativo — o que é surpreendente. Não entendo esse nível de perseguição contra mim”, afirmou.
Apesar das declarações, o ex-presidente manteve a estratégia de não indicar um possível sucessor político. Indagado sobre o prazo de desincompatibilização exigido para governadores interessados em disputar a presidência, respondeu que ainda há tempo suficiente até o período eleitoral. Chegou a elogiar o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, mas sem apontá-lo como eventual herdeiro político.
A conversa também abordou o encontro de Bolsonaro, no fim de seu mandato, com o general Mário Fernandes, atualmente preso sob acusação de envolvimento em um plano que previa o assassinato de figuras como Lula (PT), Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes, episódio conhecido como “Punhal Verde e Amarelo”. Bolsonaro minimizou a reunião, afirmando que, à época, muitas pessoas o procuravam para demonstrar apoio e avaliar seu estado de saúde. Disse ainda que cabe à Polícia Federal ouvir o general, tratando o plano como algo que poderia muito bem ter saído de um roteiro de ficção.
Questionado sobre Mauro Cid, ex-ajudante de ordens que firmou acordo de delação premiada, Bolsonaro evitou acusá-lo de mentira, mas afirmou que o militar foi alvo de métodos abusivos. “Não vou dizer que ele faltou com a verdade, mas ele foi submetido a tortura. Foi o equivalente ao ‘pau de arara’ moderno. Uma delação feita nessas condições não pode ser considerada espontânea, nem legítima”, criticou.
Em abril, ao ser entrevistado pela Folha de S.Paulo, Bolsonaro havia declarado que uma eventual prisão significaria o fim de sua vida pública. “Tenho 70 anos, se isso acontecer, acabou para mim”, comentou. Ele responde a cinco acusações, cujas penas somadas ultrapassam quatro décadas de prisão.
No final de março, o STF decidiu por unanimidade aceitar a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra Bolsonaro e outras sete pessoas, todos apontados como parte do núcleo central que organizou a tentativa de golpe em 2022. Com isso, o processo avança para a fase de julgamento do mérito, o que pode ocorrer ainda em 2025, antes da corrida presidencial de 2026.
Essa movimentação no Supremo também afeta os planos políticos do ex-presidente, que foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no ano passado. A indefinição quanto ao seu futuro abre brechas para discussões entre aliados sobre a escolha antecipada de um novo nome para liderar o projeto eleitoral da direita no próximo pleito.
A entrevista ocorre em meio a uma crise entre o STF e a Câmara dos Deputados. No dia anterior, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), criticou a decisão do Supremo que anulou uma manobra legislativa que beneficiaria o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), investigado no mesmo inquérito que envolve Bolsonaro.
Motta anunciou que a Câmara recorrerá ao plenário do STF por meio de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), alegando que a decisão fere prerrogativas do Parlamento. Ao mesmo tempo, líderes da Casa articulam a retomada da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita decisões individuais dos ministros do STF.
A PEC, que passou pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara em outubro passado, visa reduzir o poder dos magistrados de derrubar leis aprovadas pelo Congresso por decisão monocrática. A proposta é parte de uma ofensiva legislativa mais ampla contra o Supremo, motivada por insatisfações relacionadas à suspensão de repasses de emendas parlamentares.